Patógenos com potencial zoonótico estão circulando em comunidades da Amazônia Brasileira? Para responder à questão, o Instituto Todos pela Saúde (ITpS) apoia técnica e financeiramente, além de colaborar com a articulação de redes, para o desenvolvimento da Vigilância de Vírus e Outros Patógenos Emergentes da Amazônia (Vivera). A iniciativa conta com renomados pesquisadores, de instituições brasileiras e internacionais, das áreas de antropologia da saúde, saúde indígena, educação em saúde, vigilância epidemiológica, Saúde Única e doenças infecciosas e parasitárias.
“Consideramos que, devido ao seu modo de vida profundamente integrado à natureza, os povos indígenas desempenham um papel fundamental na nossa compreensão de doenças emergentes. De forma inovadora, pretendemos entender a intensidade de exposição dessas populações a material biológico com patógenos de animais domésticos, domesticados e silvestres, em uma abordagem de Saúde Única”, explica o pesquisador Wuelton Marcelo Monteiro, da Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado, da Universidade do Estado do Amazonas (FMT-HVD/UEA), coordenador principal do estudo. A abordagem Saúde Única considera os componentes ambiental, animal e humano na transmissão de patógenos.
O projeto Vivera avaliará a exposição a vírus e outros patógenos durante as atividades de caça, abate, processamento, armazenamento e consumo de animais domésticos, domesticados e silvestres, além de construir um plano-piloto de vigilância genômica aplicável às comunidades indígenas.
O ITpS tem interesse em estudos desenvolvidos na Amazônia porque a região é indicada por especialistas como potencial local de surgimento de uma nova pandemia em razão do desmatamento desenfreado e da crescente inserção humana em habitats de animais silvestres, atividades que aumentam o risco de zoonoses (doenças infecciosas que saltam de animais para humanos), segundo apontam pesquisas publicadas em importantes revistas científicas. Outro fator importante é que a biodiversidade da região é relativamente pouco estudada, devido à sua dimensão, e pode abrigar patógenos desconhecidos. "Consideramos essencial a realização de estudos que investiguem possíveis eventos de transbordamento de vírus de animais, em especial os silvestres, para populações humanas. Com isso, diminuímos o risco de sermos pegos de surpresa por vírus emergentes ou reemergentes", afirma o virologista e pesquisador científico do ITpS Anderson Brito, supervisor do projeto Vivera no Instituto.
O estudo se dará em dez comunidades indígenas situadas nos municípios de Tabatinga, São Paulo de Olivença e Benjamin Constant, no Amazonas, pertencentes às etnias Kokama, Kambeba e Ticuna. De forma pioneira e para garantir a implementação do plano que será estruturado, as populações serão coparticipantes em todas as etapas do projeto. “A estruturação e a consolidação de uma rede de vigilância genômica de vírus circulantes na região de fronteira permitirá uma compreensão mais detalhada da evolução desses patógenos e permitirá a implementação eficaz de medidas de controle e prevenção de epidemias”, afirma a veterinária virologista Helena Lage Ferreira, professora da Universidade de São Paulo e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, que participa do projeto.
O objetivo é abranger 60 famílias que têm a caça de animais como atividade de subsistência, ou seja, de caráter não predatório, totalizando ao menos 300 indígenas e 500 animais ao longo de dois anos. O material coletado dos animais será analisado utilizando técnicas moleculares e sorológicas.
A pesquisa está em fase de autorização ética nas diferentes instâncias necessárias. Já foram obtidas as anuências da Coordenação dos Programas de Pesquisa em Ciências da Saúde (COSAU/CGSAB), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); da Comissão de Ética no Uso de Animais (Ceua) da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado; do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei); e das lideranças indígenas. Está em processo a aprovação junto à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Cnep).
“O trâmite regulatório é uma etapa crucial desse tipo de projeto. O processo, por vezes encarado como um obstáculo, é um passo necessário para a proteção dos participantes da pesquisa”, explica Monteiro. “Populações especiais, como indígenas, quilombolas e gestantes, por exemplo, são comumente negligenciados em estudos, justamente pela dificuldade das anuências. Ocorre que, quando os estudos não incluem essas pessoas, o benefício dos resultados também é negado a elas no futuro.”
Além da FMT-HVD/UEA e da USP, participam da pesquisa especialistas da Universidade Feevale (RS), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade de São Paulo (USP), do Instituto Leônidas & Maria Deane (Fiocruz Amazônia) e da Universidade de Duke (Estados Unidos).
A atuação do ITpS
O Instituto Todos pela Saúde (ITpS) é uma entidade sem fins lucrativos criada em fevereiro de 2021 com o objetivo de ajudar o Brasil a articular redes e desenvolver competências que auxiliem no preparo para o enfrentamento das futuras emergências sanitárias, como surtos, epidemias e pandemias.
Os trabalhos foram iniciados com um aporte de R$ 200 milhões feito com recursos da iniciativa Todos pela Saúde, criada em 2020 e que teve o Itaú Unibanco como principal doador. O ITpS tem como associada mantenedora a Fundação Itaú e como associados a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Academia Nacional de Medicina (ANM), a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein e a Sociedade Beneficente de Senhoras Hospital Sírio-Libanês.
O ITpS atua em três frentes:
Crédito da foto: LIPeSP / FMT-HVD